quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

A paixão de Lilith



O que gente como eu tinha
a fazer com gente como Adão?

E no entanto por algum capricho
ou mesmo por obra de Seu humor negro
fomos atirados juntos, a terra
polida e o brilho da lua...

Então Adão quase me deixou
louca - meu primitivo e boquiaberto
homem, dócil como pilão
e brando como a lógica
vivia ostentando o direito divino
de suas propriedades
perante minha óbvia carência
de bens.

A princípio, tentei agradar,
abri minha caixa de milagres para ele,
ele só queria moldar as ervilhas.
Queria seus pássaros em sua mão.
Usei, de bom grado, de todos os rodeios.
Fiz um abrigo de folhas, trepadeiras e veneno para anjos,
ele não quis entrar.
Não quis se deitar sob minha improvisada
colcha de retalhos. Preferia morrer.

Ele tinha a Palavra,
recebera-a do alto, enquanto eu,
anterior aos alfabetos, inútil como um &,
permanecia mergulhada no redemoinho do caos.

Jardins foram feitos para ordenadores,
jardineiros foram feitos para ordenar,
mas eu não sou ordenável, sou a primeira transgressora.
Por isso, enquanto Adão cercava cuidadosamente suas bestas
e apertava a sebe,
e enquanto anjos guerreavam e buliam
com os nervos de Deus,
inadaptada e fora do lugar, fugi.
Xinguei Adão.
E deixei meu primeiro amor
chupando o dedão.

Pamela Hadas
em The Cauldron Press



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